Armando Fontaínhas: “O preço da uva alvarinha é bom e a prova é que continuam a vir produtores de fora. Não vem para nos fazer favor nenhum, vem porque nós tivemos sucesso”

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“Tenho em casa um prémio da Quinta da Boavista, de 1904, uma medalha de prata correspondente ao 2º Prémio do concurso nacional de vinhos brancos, atribuído a uma colheita de 1902 do vinho Alvarinho da Quinta da Boavista, com o nome do meu bisavô, Manuel Barreto, que já produzia vinho branco da casta alvarinho”


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O Presidente da Direção da Adega Cooperativa Regional de Monção, CRL, viu crescer o vinho Verde Alvarinho na região que lhe é berço – terroir, para inovarmos a linguagem – mesmo antes de uma proteção especial que trouxe valor acrescentado aos vinhos ‘Made in Melgaço’.

“O meu avo foi sócio fundador da adega. Os irmãos da minha avó vinham trazer as uvas à adega em carros de bois. É uma memória muito antiga”, observa Armando Fontaínhas, recordando a memorabilia que tem em casa de família e que se funde com a história do Alvarinho de Melgaço.

Em Julho de 1973, o jornal “A Voz de Melgaço” noticiava, na primeira página da edição 519, a deliberação do Governo indicando “que a região do Alvarinho era a região do Vinho Verde e mais concretamente a região Monção-Melgaço”.

A mesma edição deste jornal indicava ainda que, “para agradecer tão grande beneficio”, se deslocara a Lisboa uma representação das entidades locais para agradecer ao Ministro da Economia e Secretários da Agricultura e Comércio a benesse dada e discutir o ordenamento da produção de alvarinho no território.

Para recordar o que era e que caminhos percorreu a atual sub-região de Monção e Melgaço desde a exclusividade, o alargamento e a estratégia para o futuro, o jornal “A Voz de Melgaço” desenvolve, ao longo dos próximos números, uma série de conversas com personalidades que acompanharam a história do Alvarinho, os que fazem parte dela e os que procuram projetar a imagem destes vinhos para o futuro.

Inauguramos a rubrica com o presidente da Adega Cooperativa Regional de Monção, que tem memórias deste início e guarda até espólio da história do Alvarinho ainda antes da “febre” iniciada nos anos 70 do século 20.

“Tenho em casa um prémio da Quinta da Boavista, de 1904, uma medalha de prata correspondente ao 2º Prémio do concurso nacional de vinhos brancos, atribuído a uma colheita de 1902 do vinho Alvarinho da Quinta da Boavista, com o nome do meu bisavô, Manuel Barreto, que já produzia vinho branco da casta alvarinho”, conta-nos Armando Fontaínhas, notando que já no passado havia quintas particulares que produziam algum branco alvarinho, mesmo quando a tendência eram os tintos.

“O nosso consumo era de vinho tinto. Ainda hoje em casa, em família, consumimos mais vinho tinto do que vinho branco. O Alvarinho ainda hoje é um vinho de festas, de cerimónias. O território de Melgaço a Monção era de campos de milho com vinhas de bordadura. Isto há 50 anos, não há 200”, observou.

Contudo, a Adega de Monção prefere trabalhar as referências que lhe deram nome no passado, apesar de algumas experiências com tintos que são referência da região dos verdes.

“Tivemos Vinhão durante dois anos, mas comercialmente não foi um grande sucesso e decidimos não continuar. Já tivemos vinificação de Brancelho, mas não é o nosso perfil. O nosso cliente tipo vê-nos como produtor de excelência de vinhos brancos. Temos um perfil de brancos bem trabalhado. Temos uma marca de tinto que tem uma boa relação preço/qualidade, tem anos que tem sido líder de mercado Verde tinto e vende muito bem, mas no perfil tradicional. Vende bem na grande Lisboa, onde há muitas comunidades minhotas, e até ao Porto”, conta o presidente da adega monçanense.

Sobre as mudanças, diz que foram profundas e os vinhos melhoraram porque a atenção passou do milho para o alvarinho e até a rega ficou mais profissional, o que traduz naturalmente em maiores produções.

“Em trinta anos a região mudou completamente. Como se podia fazer um grande vinho numa parcela de milho, a regar até final de agosto e estrumar para produzir milho, e ter na parcela, em latada, uma vinha? O amadurecimento é completamente diferente de uma parcela que é feita a pensar para produção de alvarinho”, atira Armando Fontaínhas.

Para os vinhos de hoje contribuiu a plantação de plantas novas a condução da vinha de latada para cordão, mas também o aquecimento global.

“O aquecimento global teve uma influência enorme, aqui na viticultura. Há vinte anos, a vindima em Monção entrava pelo mês de Outubro dentro, o tinto. Atualmente começamos no início de setembro e no final do mês está toda a vindima feita”.

Desvalorização do preço da uva ou tendência da produção?

Ainda se faziam as contas em escudos e há quem se recorde que se pagava o quilo de uva alvarinha a 300 escudos (um euro e meio), mas Armando Fontaínhas diz que, aos volumes de produção de hoje, ainda que pagos ligeiramente abaixo desses números, continua a ser mais vantajoso para os viticultores.

“Nos anos 90 houve anos em que não houve vinho. No final da década [1997/98] houve anos estratosféricos porque também estamos a falar de volumes extremamente reduzidos. Atualmente o produtor recebe muito mais dinheiro, porque o que interessa não é o preço do quilo da uva, mas o rendimento por hectare. Nessa altura tirava-se meia dúzia de quilos de uva por hectare, hoje-em-dia, um bom viticultor consegue andar nas 12, 13 toneladas, sem problema nenhum. O rendimento é muito maior do que era naquela altura”, explica.

“O preço da uva alvarinha é bom e a prova é que continuam a vir produtores de fora para cá e há produtores a plantarem cada vez mais. Não é por acaso que produtores de renome, como a Symington [Family Estates, que adquiriu uma propriedade de 27,4 hectares em Monção], que podia ter comprado em Ponte de Lima ou Vale de Cambra, na região dos Verdes, veio para monção. É porque quer Alvarinho de Monção, vê algo diferente, não vem cá para nos fazer favor nenhum. Vem para cá porque nós tivemos sucesso”, observou ainda.

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