“Melgaço”, a marca de água que a SBG quer manter calada para não canibalizar o ‘diamante’ do grupo

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Há um dado histórico que ajuda a perceber a lógica interna: num estudo académico sobre a cadeia de abastecimento da Unicer (2013), Pedras absorvia cerca de 98% do segmento “água com gás” do próprio grupo, ficando Vidago e Melgaço residuais. Reforçar “Melgaço” no grande consumo canibalizaria a Pedras (o “diamante” do segmento) e, no fundo, sem ganho líquido para a casa-mãe.


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Porque é que a Super Bock Group não põe “Melgaço” ao nível de Pedras?

Melgaço tem água, e da boa. Não é nota de provador, mas de laboratório. A captação do Peso fornece uma água mineral natural gasocarbónica (borbulha por CO₂ natural), bicarbonatada-cálcica, mineralizada, com tradição de engarrafamento desde 1885 e uso termal reconhecido.

No rótulo técnico, a ficha oficial da própria Super Bock Group (SBG) é clara: mineralização total ~1.231 mg/L; bicarbonato ~877 mg/L; cálcio ~159 mg/L; sódio ~94 mg/L; pH 5,8. É uma assinatura química distinta, e valiosa.

No ringue: Melgaço vs Pedras faz sentido?

Comparar “Melgaço” a “Pedras Salgadas” como “melhor vs. pior” pode não ser a melhor forma para atribuir o prémio. Porque Pedras também é mineral natural gasocarbónica, mas com perfil bem mais mineralizado e muito mais sódico: mineralização ~2.7–2.8 g/L; bicarbonato ~1.93–1.98 g/L; sódio ~553–577 mg/L (conforme valores oficiais consultados). Vidago é semelhante a Pedras no patamar de mineralização (~2.8 g/L). Isto é: são águas diferentes, e não tanto uma questão de ‘o  meu pai é mais forte que o teu’…

Política da marca e escala industrial

A SBG (ex-Unicer) comprou, em 2002, o histórico grupo VMPS – Vidago, Melgaço e Pedras Salgadas, ficando com as captações e marcas (Pedras, Vidago, Melgaço) e os ativos turísticos de Vidago/Pedras. Desde então, o portfólio de águas do grupo gira essencialmente em torno de duas âncoras comerciais: Pedras (com gás) e Vitalis (lisa). “Melgaço” nunca recebeu o mesmo músculo de marketing, distribuição e investimento industrial, não porque não tenha capacidade financeira para o fazer, mas por decisão estratégica.

Há um dado histórico que ajuda a perceber a lógica interna: num estudo académico sobre a cadeia de abastecimento da Unicer (2013), Pedras absorvia cerca de 98% do segmento “água com gás” do próprio grupo, ficando Vidago e Melgaço residuais. Reforçar “Melgaço” no grande consumo canibalizaria a Pedras (o “diamante” do segmento) e, no fundo, sem ganho líquido para a casa-mãe. Resultado: Melgaço é mantida como água de nicho (termas, restauração selecionada, retalho limitado), enquanto Pedras sustenta a notoriedade mass market.

Termalismo forte, engarrafamento ‘tímido’

Localmente, as Termas de Melgaço continuam a ter como principal missão valorizar o perfil terapêutico: água gasocarbónica, bicarbonatada, cálcica/magnesiana, ferruginosa; 15 °C; pH 6 (valores aproximados); indicações clássicas em digestivo/metabólico (linguagem termal).

No parque, a bouvette e o balneário dão contexto e história, mas o engarrafamento local é modesto: estimativas recentes apontavam produção anual na ordem das centenas de milhares de garrafas, mas continua a ser uma escala pequena quando comparada com Pedras.

Grande Hotel do Pezo pode ajudar a valorizar “Melgaço”?

A reabertura do Grande Hotel do Pezo (com previsão de inauguração para o final do mês, a ser explorado pelo grupo Oca Hotels) reforça o ecossistema turístico das termas e facilita pacotes “hotel + termas”. É uma oportunidade para dar palco a “Melgaço” em experiências de prova, carta de bar e storytelling — sem, ainda assim, alterar a governança: hotel privado; balneário e parque na esfera pública (Cura Aquae). A curto prazo, isto puxa a imagem, mas não revoluciona a distribuição.

Na entrevista de José Albano Domingues a este jornal – publicada na edição de 1 de setembro – o candidato da AD à Câmara Municipal de Melgaço diz que “as Águas de Melgaço estão a ser preteridas” em função de outras (do grupo), mas neste caso a ‘culpa’ não é necessariamente da autarquia. A diferença no tabuleiro de jogo é estratégica, e não técnica: A água é diferente (perfil menos sódico, bom teor de bicarbonato e cálcio).

Em conclusão, e para reforçar os dados acima, no plano económico, a SBG protege “Pedras” como líder e mantém “Melgaço” num posicionamento de nicho (termal, local, seleto). Se há “injustiça”, é de portfólio: a empresa não quer dois campeões no mesmo ringue.

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