Publicidade
Desde 29 de Julho que o MDOC abriu as sessões de filmes do mundo onde a Identidade, Memória e Fronteira continuam a nortear a programação e os documentários exibidos – e a exibir, até ao dia 4 de Agosto – no âmbito do festival.
Destaque para os quatro filmes realizados em Melgaço em 2023, no âmbito da Residência Cinematográfica PLANO FRONTAL, que lotaram a primeira sessão da noite de 29 de Julho, em estreia absoluta, com presença dos autores deste trabalho académico.
Do exercício de 2023 resultaram quatro curtas-metragens documentais, num crescendo de qualidade e linguagem cinematográfica que entusiasmou o publico presente na primeira exibição e que ainda pode ver.
Por ordem de exibição – numa única sessão em que são apresentados os quatro filmes – a primeira curta que verá (abaixo indicamos o dia e horas a que serão as sessões nas Freguesias) é a de “Aires”, que é na verdade Adelino Fernandes, que passa os dias a trabalhar na sua oficina “pequenina” em casa.
“Reformado e com 87 anos dedica-se a arranjar os mais diversos objetos a pedido dos vizinhos de quem tem muito carinho, e a eles não pede nada em troca. Um retrato poético de um homem que contribui para a sua comunidade e que em troca a vida sorri-lhe de volta”, diz a sinopse.
E é precisamente isso. A curta-metragem de Lara Mather, Mafalda Vaz e Afonso “Sekkas” Nunes, explora o quotidiano de Adelino Fernandes, a vida na sua oficina, a sua horta e a sua paixão por antiguidades, que transforma a sua oficina num verdadeiro espólio de história dos objectos.
O documentário de Narcisa Blejeru, Filipa Duarte e Ariana Vieira (com apoio técnico de Diogo Rodrigues é provavelmente o que desenvolve uma linguagem mais própria, trabalhando fragmentos, num caos propositado, das vidas que passam pelo Parque de Campismo de Lamas de Mouro.
A sinopse fala-nos de um parque de campismo “longe da sufocante vida citadina”, onde “nasce um cenário sereno que rodeia a simbiose entre o ser humano e a natureza. Convida-se o espectador a sentir os momentos fugazes capturados num espaço em constante mudança, que deixa para trás os vestígios intemporais da experiência humana. Objetos, pessoas e espaços interligados num conceito hipotético, num vislumbre do passado e do presente”.
O foco são isso mesmo, os vestígios deixados por quem passa e fragmentos dos seus momentos, reflexões, festas e – lá está – tudo o que é mundano, mas num habitat especial do qual fazem parte num instante das suas vidas. A linguagem deste filme não será a mais fácil para o espectador, mas deixa margem para que reflita sobre uma ou várias camadas que encerra.
“A Mestra” é um documentário competente e ‘profissional’ que guarda em si a história de uma vida, mas que atravessa a história de dois países.
A sinopse põe as cartas na mesa: “Eudósia, uma jovem professora espanhola, foge da guerra civil e encontra refúgio na vila de Castro Laboreiro. Entre Espanha, Portugal, Marrocos e França, Eudósia atravessa fronteiras, traçando um legado de resiliência e liberdade. Narrada pelos seus filhos, Paul e Yvonne, esta história percorre as linhas divisórias que marcam pontos de conflito e de encontro entre gerações e culturas”.
É um belo exercício de imagem, que envolve o elegante testemunho dos filhos da professora que foge da Espanha de Franco e se esconde na serra Castreja onde, embora com o Estado Novo de Salazar a ameaçar a paz que ansiava quando atravessou a fronteira pelo monte, protagoniza uma das mais satisfatórias curvas da vida que jamais terão passado pelo território.
É um filme bonito, cativante pela história de Eudósia e que merece ficar nos pergaminhos da história de Castro Laboreiro e do próprio concelho, não apenas como um exercício académico, mas como merecido conteúdo histórico que é, a exemplo de muitos outros que tem ganho forma ao longo da última década de festival. Um trabalho de que Silvana Torricella, Diogo Silvestre e Norberto Valente se orgulharão, sempre que contarem acerca da sua experiência na Residência Cinematográfica de 2023.
Por palmas, risos e interação com o contexto/objecto do filme, “Ribeiro de Baixo Cabo do Mundo” foi o que melhor seduziu o auditório. A riqueza da paisagem e do quotidiano dos residentes em Ribeiro de Baixo era um maná para quem o soubesse aproveitar, e o trio Nuno Mendonça, Rodrigo Queirós e Vitor Covelo soube fazê-lo bem.
Há misticismo, tradições, pessoas com vivências singulares que ficaram encerradas neste filme e onde até a paisagem é um protagonista em crescendo, sem sequer verbalizar um ‘ai’ (como é próprio das paisagens, que só estão e deixam para os seres que as habitam tecer pareceres sobre elas). Há identificação entre os três elementos que assumiram a autoria desta curta-metragem e talvez por isso o objecto fílmico resultante tenha ganho uma identidade muito vincada também.
O público aclamou e é certamente um dos trabalhos a não perder desta sequência de filmes que, em boa hora, resultou dos exercícios académicos do ano transato.
Restam apenas duas sessões para ver as quatro histórias na tela grande, veja onde ainda pode assistir e a que horas: