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Éder Hammer Jann, o presidente que “só queria jogar”
Éder Hammer Jann, natural do Brasil, completa, em 2025, vinte anos desde que chegou a Portugal. A Melgaço chegou há menos, mas já vestiu a camisola pela terra que o acolheu diversas vezes. A carreira enquanto jogador tem sido feita pelos clubes do Alto Minho e, na época 2024/2025, “queria apenas jogar”, mas acabou por ser nomeado presidente da Comissão Administrativa (CA) do Sport Clube Melgacense.
Na última década, o clube de Melgaço, a jogar na 1ª Divisão da Associação de Futebol de Viana do Castelo (AFVC), tem sido profícuo em Comissões Administrativas que, apesar do carácter temporário e transitório que significam, se tem tornado a única forma de fazer sobreviver o plantel Sénior, ou pelo menos, o único plantel que poderia gerar receita de bilheteira ao clube.
Contudo, quer as gestões transitórias, quer as presidências de carácter mais permanente, têm desembocado em fins de época com sabor amargo, e nem sempre consequência dos resultados em campo – veja-se a presidência de Emídio Afonso que, em 2023, com Tiano Faria no comando técnico, levou o SC Melgacense a 1ª Divisão da AFVC e demitiu-se no fim dos festejos – mas pela desistência dos líderes, que se queixam de ficar a trabalhar praticamente sozinhos e de uma bancada que não gera entusiasmo nem receita.
A Comissão Administrativa liderada por Henrique Silva lamentava também alguma falta de afluência de sócios ou entusiastas do futebol na bancada e ‘o senhor que se segue’ na liderança, Eder Jann – que entrou de repente, em finais de julho de 2024 – mantém o mesmo lamento.
“Sempre joguei, participei e tentei ajudar da melhor forma possível, e nesta época não é diferente. Pegamos no clube, tivemos de montar a equipa toda à pressa, e não é fácil pegar num clube com zero euros em caixa”, começa por contar.
“A minha intenção nem era ser presidente, era jogar mais uma época, porque é uma coisa que gosto, desfruto e vivo isso. Houve a possibilidade de pegar numa Comissão Administrativa para ajudar, entrei, tentei ajudar da melhor forma possível. Estou como jogador para ajudar, não para prejudicar. A questão de jogar ou não jogar já é uma questão da comissão técnica, não é porque sou o presidente que tenho de jogar. No momento em que sentir que estou a prejudicar a equipa, tenho de sair, porque senão estou a prejudicar o meu próprio trabalho”, sublinha Éder Jann.
A distância de Melgaço em relação aos centros mais urbanos (ou onde se vive mais a afición desportiva) tem sido um problema adicional para o concelho que tem “a melhor estrutura do distrito”.
“Melgaço é um meio muito pequeno, ninguém quer vir jogar aqui para cima, embora tenhamos a melhor estrutura do distrito. Só Porto ou Braga, aqui a Norte, tem uma estrutura como a nossa, nem mesmo Viana. Mesmo com o que o Centro de Estágios nos tem ajudado, tudo isso é uma mais-valia, só que, para um jogador de Viana vir para aqui, é longe e muito cansativo”, considerou.
O jogador e presidente da Comissão Administrativa dá nota ainda de jogadores de nível de campeonato nacional, falta, no entanto, fazê-la funcionar como um todo e saber lidar com a pressão da segunda metade da época.
“Temos três ou quatro jogadores de nível de campeonato nacional, mas o grupo tem que ser completo, três ou quatro jogadores sozinhos não fazem a diferença. Não foi fácil montar o plantel, temos algumas coisas a melhorar. Se fizer falta, em janeiro vamos buscar mais um jogador ou dois para compor o elenco. O objetivo sempre é a manutenção o mais cedo possível, não queremos deixar a equipa baixar de divisão”, notou.
“Vemos direções com 15 pessoas a trabalhar, nós somos 4”
Éder Jann reconhece ser difícil estabelecer uma equipa sénior a competir no campeonato distrital, onde faltam patrocínios ou voluntarismo para assumir cargos no clube.
“É difícil, mesmo a nível de patrocínios, temos poucos. Neste momento, estamos quatro pessoas a trabalhar, numa direção. Para levar um clube deste tamanho, não é fácil. Vamos a outro lado e a ‘torcida’ (claque) está toda com o pessoal, mesmo em último lugar, e tem dez, quinze pessoas a trabalhar, como nós temos visto. Mas nós aqui sempre foi um problema e nas últimas épocas há pouca gente a trabalhar. Já na época passada não foi fácil para eles [CA antecedente], também tiveram muita dificuldade, com poucas pessoas a trabalhar e este ano continua igual, porque não se encontra ninguém que tenha coragem de vir pra aqui e deitar uma mão ao clube, entende?”, expõe Éder Jann.
A CA a que preside estreou-se com um nome sonante para o comando técnico: Andrés Madrid, ex-jogador do SC Braga, do FC Porto (por empréstimo do SC Braga) e do Vianense, estabeleceu-se como treinador ao longo da última década e chegou a Melgaço no início da época. A este nome seguiam-se outros, de jogadores de dentro e ‘de fora’, e o fantasma das contas voltava a assolar alguns. Éder Jann desmonta os medos.
“Embora vários jogadores tenham uma ajuda de custo, eu estou aqui para ajudar, tenho zero ajudas de custo. Pelo contrário, tenho posto muito do meu bolso para ajudar, para tentar suprir outras coisas. Toda a gente deve imaginar que o Andrés Madrid deve ganhar uma fortuna aqui, mas não, o Andrés Madrid veio para ajudar. Apresentamos no outro dia as contas em Assembleia, é uma comissão técnica um pouco mais barata do que a do ano passado e está aqui para ajudar também. Acredito que vamos sair desta situação. As vitórias vão aparecer e as coisas vão melhorar”, auspiciou o líder da comissão administrativa… que só queria jogar.
Raúl Cardoso, treinador, o eterno “bombeiro” do SC Melgacense
Raúl Cardoso é um dos rostos indissociáveis da (sobre)vivência desportiva do Sport Clube Melgacense. O atual treinador do escalão de Iniciados do clube desde o início da época 2024/2025, faz parte da ‘mobília’ e continua disponível para “dar uma mão” sempre que o chamam a terreiro.
É quase uma vida de dedicação enquanto treinador dos vários escalões de formação e até do plantel Sénior em diversas situações – transições entre contratações de técnicos, mas chegou a assumir uma época inteira – além de filho de Aurélio Cardoso (falecido no final de novembro de 2022), um dos membros fundadores do SC Melgacense, nos idos de 1955, quando se começou a cortar o tojo e outros matos no Monte de Prado para dar forma ao campo de futebol onde hoje é o Centro de Estágios de Melgaço.
“Estamos a fazer um trabalho para que eles se divirtam, tenham iniciativa, para que desfrutem um bocado do que é o futebol, porque nem todos vão ser jogadores, mas para que sintam um bocadinho do que é jogar futebol e representar o clube da terra”, diz Raúl Cardoso.
O compromisso “não é de todos”, porque não é unânime a vontade de fazer carreira, mas embora cheguem ao futebol iniciado “porque o amigo ou o colega também vêm”, mas ao longo das jornadas fica a sensação de que “a partir do meio da época até ao fim, quase toda a gente fica a gostar”.
A bancada – à chuva se for dia disso, com guarda-chuva aberto – compromete essencialmente os pais e familiares das crianças que dentro de campo tentam concretizar a vantagem no marcador.
“O compromisso dos pais, tios, avôs, que vêm ver os jogos, que nos estão sempre a acompanhar, conta muito. É totalmente diferente dos Séniores, porque neste escalão podemos ver os nossos miúdos a divertirem-se, a serem bem acompanhados, a terem um compromisso”.
Contudo, como observa Raúl Cardoso, é quase paradigmático que, no momento em que os pequenos talentos conseguem a maturidade certa para transitarem para o plantel sénior, tenham que abandonar o concelho.
“O clube em si também tem uma certa culpa, porque temos uma desvantagem. Os nossos jovens, ao chegar aos 17, 18 anos, a maior parte vão estudar fora. Antigamente, os treinadores ainda aceitavam que os jogadores viessem treinar só uma vez por semana e jogavam ao domingo, hoje já é mais complicado, tem que fazer os treinos todos. Para os nossos miúdos, que vão estudar para Braga ou Porto, isto é impossível”, observa o treinador.
Uma vez que os talentos locais e filhos da terra se dispersam pelas universidades do país, a alternativa poderia ser a presença da Escola Superior de Desporto e Lazer de Melgaço (a poucos metros do estádio onde o clube treina e joga) para captar treinadores ou jogadores que, a par dos estudos, se comprometessem com o clube pelo período possível, indica Raúl Cardoso.
“Podia-se aproveitar a escola que temos aqui para captar treinadores ou até jogadores, mas tinha de haver uma linha orientadora a nível do clube totalmente diferente, com um projeto bem definido, que é coisa que de momento ainda não há”, apontou.