A crise da lampreia e as ‘novas’ espécies do rio Minho: Exóticas ou futuro?

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“Se a UE proibir a pesca do meixão e a lampreia não recuperar, temos de transmitir que estes recursos também têm valor”


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Carlos Antunes, Diretor do Aquamuseu do Rio Minho, localizado em Vila Nova de Cerveira, junto ao rio objeto de estudo, teve o seu primeiro contacto com as águas transfronteiriças em 1985, ainda como aluno.
Um professor da Universidade do Porto, de que era aluno, estava a fazer a tese de doutoramento no Alto Minho e trazia os alunos ao rio Minho para fazer as práticas de ecologia.

E nascia assim, ainda que ambas as partes não o soubessem, a ligação entre o Pai Minho e o seu aluno mais dedicado, interessado em saber quanta da vida leva o caudal responsável por alimentar diretamente milhares de vidas, entre as espécies que cria no seu seio e as que, da margem, tem nele o suporte vital.

Naquela altura “o rio Minho era completamente ignorado, na nossa área da biologia, da ecologia. Vamos ver os trabalhos que existem, e não existe praticamente nada”, lamenta o biólogo, em declarações a este jornal.

Nem mesmo a componente turística, hoje a atravessar um bom momento, tinha no início dos anos 90 (do séc. XX) a mesma expressão, apesar de o rio já merecer destaque pela sua ‘marca’ pela pesca.

“A marca Rio Minho existia porque no contexto ibérico encontrávamos em restaurantes em Lisboa, no Porto ou em Madrid ‘Há Salmão do rio Minho’, ou ‘Há Sável do Rio Minho’, ‘Há Lampreia…’. Por alguma razão os espanhóis o chamam o Pai Minho. Era dos rios mais importantes no contexto ibérico, no que diz respeito a estas espécies migratórias. Pela sua abundância”, nota ainda Carlos Antunes, que teve de defender a causa do Aquamuseu durante mais de uma década. Concretamente, desde os anos 90, até 2005, data em que foi oficialmente inaugurado, foram 15 anos de espera para poder mostrar o que andava a fazer no rio e responder finalmente à pergunta que muitos pescadores faziam.

“A nossa atividade, em termos de investigação, é essencialmente no rio e na altura precisamos muito, e ainda hoje, da colaboração dos pescadores. E naquela altura não havia internet, então uma das coisas que os pescadores perguntavam era, para que é que isto serve?”

Carlos Antunes, Diretor do Aquamuseu do Rio Minho

No fundo, criavam-se as bases para o conhecimento do rio Minho, porque, recorda ainda, “tudo o que era produzido em termos de literatura científica, era chamada literatura cinzenta, porque era produzida em teses ou artigos e ia para as prateleiras das universidades”.

“O facto de ser um rio importante, [mas] mal conhecido, alimentou esta ideia de criar algo que originasse algum retorno da atividade científica, que ficasse acessível à comunidade e às pessoas que visitam esta região. Tornar visível a parte da investigação”, é a resposta de Carlos Antunes, comunicada frequentemente aos turistas, escolas e outros visitantes que querem ver, através do aquário ou no espaço adjacente, a diversidade do rio Minho ali concentrada.

E há 24 anos que a mostra, assim como algum espólio recolhido com a ajuda dos pescadores, nomeadamente os instrumentos e artes de pesca, “antes que se queimassem”.

O que nos traz a esta conversa é a lampreia, a variação do seu povoamento nas águas do Rio Minho, mas há ainda outras riquezas destas águas, como o Sável, o Salmão, o Meixão. Em períodos em que, nem o salmão nem o Sável tinham valores expressivos, o conhecimento científico veio prever e dar esperanças.

“O outro lado da nossa atividade, é um pouco fazer registo das memórias dos pescadores, e eles contam que nos anos 80, praticamente não iam à pesca do Sável. Pensavam que tinha simplesmente desaparecido do Rio Minho. Depois, de alguma forma foi recuperando, em níveis ainda relativamente baixos, mas pode dizer-se que ainda se mantém esta atividade da pesca para o Sável”, conta Carlos Antunes, notando para outras espécies que poderão não ser tão fiéis às águas do Minho.

“A expressão era principalmente a Lampreia e o Meixão, a enguia juvenil. Eu comecei a trabalhar com esta espécie, dada a importância que tinha em termos comerciais e que, a partir dos anos 80, começou a diminuir à escala europeia. Os registos da pesca do Meixão [iniciados em 1974] revelam que, a partir dos anos 80, começam a diminuir”, indica.

A tendência não era apenas local e a espécie, pescada a nível nacional, vem a beneficiar de uma proteção especial a partir do ano 2000, quando se determina a proibição da pesca em todo o território nacional, exceto no Rio Minho. Uma benesse que os pescadores, com a devida licença, estão a aproveitar, mas a exclusividade poderá chegar ao fim a curto prazo.

“A União Europeia está a pressionar para que seja proibida a pesca da enguia à escala europeia, sem exceções, a todas as fases: Meixão, enguia amarela, enguia prateada. Estamos numa fase de negociação para percebermos o que vai acontecer para a próxima época [piscatória]”, nota o biólogo.

O cenário em que os períodos de menos população de lampreias ou outras espécies tradicionalmente associadas ao Rio Minho possam ser mais longos não está fora de hipótese, não obstante os registos efetuados ao longo de mais de um século apontem para a hipótese de, no futuro, os gráficos possam ser favoráveis ao sector. O que não se consegue medir é o grau de paciência das novas gerações de pescadores, concretamente os das pesqueiras, na espera pelo ciclo de subida.

“O Rio Minho tem o privilégio de ter a série mais longa a nível nacional. Não há nenhum rio em Portugal que tenha uma série [de registos de pesca] tão longa”, nota Carlos Antunes, que consegue ter uma perceção – com base nos registos feitos pela Capitania do Porto de Caminha, que recolhia dados dos pescadores, por isso com alguma margem de erro – do povoamento destas espécies desde 1914. Há por isso mais de cem anos de registos que revelam períodos menos bons, mas, no que respeita à lampreia, a tendência era de subida até 2009, 2010.

Com base nos registos disponíveis desta série, a maior descida foi no período entre 1976 e 1980, no qual desceu dos 38 mil exemplares pescados na época 76/77 para o mínimo de cerca de 8 mil exemplares em 1979, tendo subido novamente para valores razoáveis no que será a época 79/80.

Ainda face aos registos, e para termos uma ideia das quebras face ao impacto na atividade piscatória, este mínimo só voltaria a ser atingido na época 2021/2022, cujo volume declarado andará nos 8 mil exemplares pescados.

“Esta série longa, desde 1914 até o presente, revela uma tendência, em relação à Lampreia. Foi a única migradora que tinha esta tendência de subida. Claro que aqui podem colocar questões do género: A aquisição dos dados, porque a Lampreia antigamente, além da rede, também era apanhada com artes da pesca como a fisga; mas também o registo das próprias autoridades, com mais ou menos rigor. Nós sabemos que os dados dos pescadores são subestimados, ou seja, não refletem o que realmente pescam. No caso da lampreia, temos mais ou menos a perceção do quanto este valor é subestimado. Num ano em que existe um registo oficial de 50 mil lampreias, e estou a falar só do lado português, pode significar que entraram 200 mil [no rio Minho]. No caso da Lampreia, nos últimos treze anos, a tendência inverte-se e começa tendência a ser de descida. Ou seja, a lampreia está a refletir um pouco o que aconteceu já há mais tempo com os outros migradores”, analisa Carlos Antunes.

De facto, e ainda de acordo com os dados em consideração pelo biólogo do Aquamuseu do Rio Minho, desde 2010, o registo oficial tem sido inferior aos 40 mil exemplares capturados e já desde 2018 que o sentido do gráfico é descendente, abaixo dos 30 mil exemplares.

“Não sabemos se ela vai ter capacidade para recuperar. O facto é que nos últimos anos tem mantido níveis muito baixos, mas também é uma espécie menos pressionada em termos de consumo”, acrescenta Carlos Antunes

“Não sabemos se ela [a Lampreia], nos próximos anos, vai conseguir recuperar, se vai ver estes picos de maior abundância em alguns anos. É que, no caso da Lampreia, não há nenhuma evidência científica de que ela venha reproduzir-se ao rio onde nasceu, ao contrário do salmão e do sável. E isto é importante em termos de conservação, porque no dia em que desaparecer o último casal de salmões ou de sável do Rio Minho, desaparece, aí é que deixam de entrar”.

O biólogo diz-nos que este é o momento certo para perceber se as alterações climáticas, a industrialização e a poluição dos rios poderá decretar mudanças irrecuperáveis no povoamento piscícola dos rios e consequente novo paradigma para o sector da pesca no rio Minho.

“O salmão é a espécie mais sensível e que está no limite sul de distribuição. O salmão, as trutas, são peixes de águas frias. Neste momento, os únicos rios onde entra o salmão, no sul da Europa, é o Minho e o Lima, e no Lima não sabemos muito bem se tem uma população funcional, mas aparentemente ainda terá. Depois é para a Norte”, explica.

As espécies atualmente invasoras são fatores de ameaça para as autóctones, mas Carlos Antunes diz que, da perspectiva científica, a fragmentação dos rios (com a construção de barragens) foi “o fator brutal” para o decréscimo destas espécies.

“Há uma relação muito nítida da diminuição de Sável com a progressiva construção das barragens. O Salmão ainda tem esta questão das mudanças climáticas, se aqui aumenta a temperatura, pode deixar ter condições para utilizar estes ecossistemas”.

A lampreia enquanto indicador da qualidade das águas

É indissociável o povoamento, desova e regresso da lampreia aos rios onde cresceram com a qualidade das águas. Para Carlos Antunes, é determinante esta qualidade que faz com que as larvas possam emitir sinais de garantia e assegurar regressos

“Depois de se reproduzir, as larvas passam quatro anos na água doce, enterradas nos sedimentos. Então, fenómenos de poluição, de degradação do habitat, zonas de postura completamente sacrificadas por alterações de caudais, ondas de calor, podem influenciar. E elas têm maneira de comunicar. Há evidências científicas de que há bacias onde já não entram Lampreias. Aparentemente, as larvas que estão nos sedimentos lançam umas substâncias químicas, umas feromonas, que são recebidas pelos reprodutores como um sinal de poder entrar neste sistema. Ou seja, como que a dizer ‘aqui há condições para vocês entrarem, para os vossos filhotes crescerem’. É um sinal positivo”, explica o biólogo.

A perda de habitat ideal – o tal de há cem anos – no Rio Minho foi de 90%, “isto tem de ter impactos”, sugere Carlos Antunes. “Se antigamente um salmão, ou uma lampreia subia 250 quilómetros de rio e agora só sobe 75, mais os afluentes, quando ela entra, porque o Sável não entra em afluentes, isto tem reflexos, obviamente”.

Eólicas offshore podem ter impacto na pesca e na entrada de espécies no Rio Minho?

No início de 2023, alguns pescadores de Viana do Castelo manifestaram-se contra a instalação de aerogeradores no mar, um género de projeto piloto a nível nacional que se prevê intensificar a curto prazo. Ao largo de Viana do Castelo já estão instaladas três eólicas, visíveis de terra, e o Governo quer avançar com a criação de mais cinco áreas de exploração de energias renováveis no mar entre Sines e Viana do Castelo. O objetivo 2030 é atingir a capacidade de produção de 10 Gigawatts, com a instalação de parques eólicos offshore, isto é, em que a energia é obtida através da força do vento em alto mar.

Há fundamento para a teoria das ondas eletromagnéticas, que poderão afastar o peixe, ou mesmo de a barreira física que se constrói possa influenciar a entrada das espécies migradoras nos rios?

Carlos Antunes diz que a questão, “como tudo o que é recente, peca pela falta de conhecimento. Isto é relativamente recente e ainda não existe muita informação científica”, contudo já há alguns grupos de trabalho “a tentar perceber as consequências disso, se há fatores negativos”.

Para já, os positivos sublinhados têm a ver com a possibilidade de criar recifes artificiais.

A Iberdrola, um dos grandes players nas renováveis on e offshore, em comunicado de imprensa de 2022, promovia uma série de iniciativas amigas do ambiente na base destes parques de alto mar, nomeadamente, “o uso de materiais sustentáveis, um projeto específico que promova a biodiversidade marinha ou o plantio de algas”.A empresa também sugere incluir espaço para a natureza nas fundações, tais como plataformas de criação de focas, estruturas artificiais de recifes ou viveiros de marisco”.

E para as migradoras que tem o Rio Minho como casa-mãe?

“Em termos físicos, para o Minho até poderia beneficiar. A lampreia não tem pesca no mar, mas na questão do Sável, imaginemos que se cria ali uma zona onde os sáveis podem circular livremente para entrar no rio, como se fosse um corredor… Porque o problema desta espécie é a pesca acessória no mar, e nunca se conseguiu resolver isso, criar um corredor ecológico para que as espécies circulem antes da entrada no rio”, considera o biólogo.

Lampreia das pesqueiras. Não se poder comercializar “não faz sentido”

“Está a promover-se um produto de Melgaço que não pode ser comercializado”

Ao longo do rio Minho há diferentes graus de pesca e de atividade piscatória. Na foz, de Caminha até Seixas, a atividade é profissional e há um grupo de pescadores que vivem exclusivamente da pesca de rio e de mar; no troço de Valença até Monção, a atividade será um complemento e no troço das pesqueiras, de Lapela (Monção) até à fronteira de Melgaço com a Galiza, “não se pode comercializar o pescado”, está por isso limitado ao consumo pelos pescadores.

“Não faz muito sentido, e isso é algo que já tem sido discutido nos últimos anos, porque dificulta em termos de promoção do produto. Está-se a promover um produto de Melgaço que não pode ser comercializado. Isso já foi discutido em Comissão e em grupos de trabalho já foi colocada essa questão e do lado português parecia relativamente fácil iniciar-se esse processo em termos de comercialização, que teria obviamente de ser colocada às associações de pescadores, que sabem, conhecem esses processos”, considerou Carlos Antunes.

“Não faz muito sentido, e isso é algo que já tem sido discutido nos últimos anos, porque dificulta em termos de promoção do produto. Está-se a promover um produto de Melgaço que não pode ser comercializado. Isso já foi discutido em Comissão e em grupos de trabalho já foi colocada essa questão e do lado português parecia relativamente fácil iniciar-se esse processo em termos de comercialização, que teria obviamente de ser colocada às associações de pescadores, que sabem, conhecem esses processos”, considerou Carlos Antunes.

O biólogo diz ainda que é necessário trabalhar na garantia da origem do produto do Rio Minho, no qual já há experiências piloto, para que de facto a lampreia do rio Minho saia beneficiada.

Nós sabemos que em todos os anos, e este ano não foi exceção, a partir de certa altura os preços baixaram. O preço das lampreias este ano foi impressionante, de 70, 80 euros, mas a partir de certa altura teve de haver importação e quando há, os preços baixam relativamente. E aí gera-se um conflito, porque baixa o preço e está a introduzir-se um produto que não é do Rio Minho. E o do Rio Minho é que é bom”, expõe.

Sobre a forma de garantir a origem do produto neste rio, Carlos Antunes diz que houve já um projecto que trabalhou no sentido de tornar o processo exequível, que passa por colocar uma etiqueta com um microchip que permita rastrear todo o percurso de um determinado exemplar desde o dia da pesca até ao consumidor final.

“Com uma aplicação no telemóvel conseguimos perceber o rasto da lampreia desde o pescador até ao restaurante. Aí, o consumidor faria como que uma última leitura”, sugere o biólogo, notando que o sistema teria de ser montado “de forma a evitar a fraude”. “Estamos a tentar, ainda não desistimos ideia de o fazer, neste momento, com alguns voluntários a nível de pesca”.

Contudo, observa que o procedimento a ser implementado “não podem ser os pescadores a colocar a etiqueta”, mas um sistema que garanta a autenticidade do produto.

“Pode continuar o modo artesanal e até pode haver lampreia de França na mesma, agora, as pessoas teriam a oportunidade de escolher. Nesta fase piloto era interessante perceber estas diferenças, confrontando uma pessoa que vai a um intermediário comprar lampreia ou está num restaurante, dizermos-lhe que temos lampreia que tem esta garantia de origem, e temos lampreia que não sabemos de onde é, pode ser do Minho ou de outro rio qualquer. Depois perceber que reação o consumidor tem perante esta diferença”, sugere.

Espécies exóticas no Rio Minho. Invasão ou mudança de paradigma?

A Achigã, a Perca Sol, o Góbio, a Carpa, o Peixe-pimpão ou o Peixe-mosquito são algumas das espécies introduzidas no Rio Minho e que tem feito com que o ecossistema das espécies autóctones fosse sendo ameaçado. Mas, não obstante o descuido de alguns pescadores, com introdução involuntária de peixes que serviam de isco na pesca à cana, outras foram introduzidas como política do Estado “para promover a diversidade”. Hoje, algumas dessas espécies adaptaram-se ao rio Minho e proliferam de forma que, no futuro poderá implicar a mudança de paradigma e aceitá-las como fonte rentável, uma vez que as autóctones podem apenas, no limite, partilhar o habitat e tentar sobreviver-lhes.

“As introduções já fizeram parte da política do Estado em meados do século passado. Nos anos 50 introduziram-se achigãs e trutas arco-íris, porque na altura se pensava que poderiam aumentar a diversidade e promover a pesca desportiva. Verificou-se depois que estas introduções causavam impactos mais negativos do que positivos, o que chamamos em ecologia o efeito Frankenstein”, indica Carlos Antunes, notando que de entre as introduzidas que se estabeleceram está o colorido peixe-pimpão ou o pequeno peixe-mosquito. A truta arco-íris sem muito sucesso e é por isso das introduções que não se adaptam à água do rio Minho e relegadas para a aquacultura.

“Nos anos 90 foi a década das novas introduções, então aparece a Carpa, a Tenca, o Góbio e recentemente aparece a Perca Sol. Estas espécies, quando são introduzidas no sistema e se estabelecem, o próprio ecossistema ao longo do tempo vai ter tendência a reequilibrar-se, mas com esta presença e com os seus efeitos, porque elas podem competir pelo alimento ou podem começar a alimentar-se até das espécies que vivem cá”, notou.

Para já, e ainda segundo o biólogo, alguns dos afluentes do Rio Minho serão os habitats mais protegidos da exóticas, ou não colonizados por estas espécies, para além da foz.

Sobre os repovoamentos, como é o caso do salmão, um esforço transfronteiriço que não tem traduzido num aumento considerável desta espécie no rio, Carlos Antunes reconhece ser uma luta pela manutenção das autóctones que vale a pena manter, mas outras que deixaram estas águas acabam por confirmar que as mudanças vão provocando alterações no tipo de migradores que povoam o rio.

“O esturjão, um peixe migrador que existiu aqui há 100 anos no rio Minho e em Portugal desaparece na década de 70. Há locais onde se pensa em reintroduzir o esturjão. Se pensarmos no Minho, faz sentido isso? Ele não tem espaço para migrar. A questão é, faz sentido, se as condições que levaram ao seu desaparecimento se mantém?”, questiona o biólogo, num raciocínio válido para as espécies que tem vindo a diminuir a sua presença nestas águas.

“É um facto é que os sistemas mudaram, e mudaram no sentido de não beneficiar a sua introdução”, diz ainda, notando que as espécies introduzidas “provavelmente, em termos de futuro e dadas as mudanças de clima que estão a acontecer, estão mais bem-adaptadas para ter sucesso”.

“Há alguma resistência em termos de consumo destas espécies, porque não há a tal questão cultural. O nosso consumo está relacionado com as espécies que consideramos nobres. Então, se temos de lutar para manter as nativas, temos, mas não vamos conseguir através da irradicação das exóticas, não vamos conseguir”.

“Ainda estamos cheios de preconceitos, mas temos de repensar ao longo do tempo, porque se realmente estas mudanças vão acontecer, se a União Europeia está neste momento, como já disse, não sabemos qual será o futuro da pesca do Meixão. Em termos económicos, atualmente no Rio Minho, é essencialmente Meixão e Lampreia, depois há o Sável e o Salmão, mas a uma escala diferente. Se for proibida a pesca do Meixão, se a lampreia não consegue recuperar em termos de povoação, qual vai ser o desafio que se vai colocar a esta comunidade piscatória? Arranjar-se uma alternativa em termos de recursos da pesca, e para isso há todo um trabalho que não é só pescar, é todo um trabalho de transmitir que estes recursos também tem um valor”, perspetivou Carlos Antunes, desmistificando a ideia que temos das espécies atualmente desvalorizadas pelos pescadores do rio Minho.

“No sul de Portugal consome-se Carpa, e é provavelmente o peixe será água doce mais consumido do mundo. Na Europa Central há aquaculturas de Carpa, come-se carpa no Natal em alguns países. É uma questão cultural, e aqui temos esta resistência por isso mesmo, mas temos de definir, repensar, em termos da própria comunidade”, desafia Carlos Antunes.

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